segunda-feira, 30 de março de 2009

A Aposta de Pascal segundo Pondé

Esse fragmento é parte da entrevista do filósofo Luiz Felipe de Cerqueira Pondé concedida à Revista Filosofia - Ciência e Vida, edição no. 27, de outubro de 2008. Resolvi postar, pois trata de um dos assuntos mais relevantes para cada ser humano: a existência de Deus. Deus existe? Para Pascal, a dependendo da resposta que dermos a essa resposta estaremos atraindo para nós implicações de dimensões eternas. Matematicamente, sempre que apostarmos, perderemos. Então, baseado nesse fato, é melhor crer e não apostar, pois se apostarmos e perdemos a aposta, não perdemos apenas a aposta, perdemos a própria vida ao lado da luz.


Filosofia - Você estudou Pascal por bastante tempo. Como inserimos o seu pensamento na lógica pós-moderna? Como a aposta pascaliana nos ajuda a entender a religiosidade atual?

Pondé – Pascal é um homem do século XVII vendo nascer a modernidade e já apontando para as suas fraturas. Em seus escritos, ele diz algo como “espaços infinitos que me apavoram. Deus não está mais em lugar nenhum. A natureza não é mais a manifestação de Deus, é tudo pedra atraindo-se e repelindo-se ao mesmo tempo”. Ele também é um crítico do racionalismo, proferindo a frase que virou samba aqui no Brasil, “o coração com sua razão tem razões que a própria razão desconhece” e dizendo que “Descartes é incerto e inútil”.
Pascal era um matemático, está nas bases do cálculo de probabilidade, no cálculo infinitesimal, era cientista de fato. Sua aposta consiste no seguinte: se você apostar que Deus não existe e viver como se Deus não existisse, aparentemente você ganha, porque fez o que quis da sua vida. Agora, se aposta que Deus não existe, e Deus existir, aí perde tudo. Porque a sua vida aqui é finita, mas você vai perder infinitamente no pós-morte. Isso quer dizer que racionalmente, do ponto de vista matemático, a crença em Deus é muito melhor do que a descrença em Deus, porque Deus existir você perde a sua condição infinita. Com isso ele quer provar que, toda vez que você aposta contra o infinito, você perde. E como o infinito está em jogo, ou seja, a imortalidade da alma, apostar contra ela te leva sempre a perder, porque ela é infinita... Mas o problema é que no final desse fragmento de Pascal chamado “Infinito Nada”, seu interlocutor diz: “eu sinto muito; concordo com você, mas não consigo acreditar”. A conclusão dele é que a razão é tão incerta e tão inútil que, mesmo que seja racional e matemático acreditar em Deus, você não acredita por causa disso. Logo, ele pensa que acreditar em Deus é uma questão de Graça. Ou você tem ou você não tem, não tem nada de racional. E isso é uma ideia de Pascal, é uma ideia clássica do cristianismo.

Filosofia – Mas isso é um Deus ex-machina que acaba com qualquer argumentação.

Pondé – Ele elimina o debate porque, aparentemente, não importa o que você pensa, é Deus quem determina o que você acredita. Por outro lado, Ele ilumina as incapacidades da razão em determinar os afetos, por exemplo. Ele esclarece a incapacidade racional em determinar a vontade (e esse é o foco da aposta), e produz um debate monstruoso sobre a insuficiência do ser humano. A razão resolve pouco, mas não os problemas básicos do ser humano. Ele consegue resolver problemas de esgoto, por exemplo, mas não consegue resolver o pânico do medo de morrer de diarréia.
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PONDÉ, Luiz Felipe de Cerqueira. A liquidez do pântano Pós-Moderno. Filosofia - Ciência e Vida. Edição no. 27, outubro de 2008, Editora Escala.

segunda-feira, 16 de março de 2009

O reino que se assemelha a um tesouro oculto – Mt 13.44

O capítulo 13 de Mateus trata especificamente sobre as parábolas do Reino de Deus.

A definição, segundo o Aurélio, para o termo parábola é que esta forma literária

É uma “narração alegórica na qual os elementos evocam, por comparação, outras realidades de ordem superior”.

Jesus foi os dos maiores mestres neste estilo.

Ninguém conseguiu sintetizar com tanta exatidão, engenhosidade e beleza, sempre se posicionando numa perspectiva escatológica, como Jesus.

No texto em questão, os discípulos interpelam Jesus acerca do porquê o Mestre os ensinava por esse meio tão pouco claro para alguns(10).

Desde o início do capitulo 13, Jesus ensina às multidões por parábola, “porque vendo, não vêem; e, ouvindo, não ouvem, nem entendem” (v. 13).

Essa era a explicação: para que se cumprisse os profetas (vv. 14-16).

Porque a vós é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles não lhes é dado” (v.11).

De modo que trata-se de um "capítulo parabolar" aonde Jesus explicita com bastante clareza para os discípulos o efeito “explosivo do Reino de Deus” que não podia ser detido.

Isso é visto, por exemplo, na parábola do grão de mostarda e do fermento (vv. 31-33).

Elas sintetizam esse poder de crescimento.

De uma pequena semente, mostarda, uma grande árvore se forma e nela se aninhava as aves do céu nos ramos;

Do fermento e de suas propriedades químicas, uma emulação se daria a ponto de fazer crescer toda a massa.

O Reino do Céu era um pão de trigo, que por mais minúsculo que aos olhos do observador afastado não represente muito interesse, quando pronto torna-se em algo grande, crescido, apetitoso.

De modo, que ao final daquela instrução tão interessante e tão criativa, os discípulos observavam que Jesus se utiliza de aspectos extremamente simples e corriqueiros e os transforma em verdades teológicas de grande profundidade espiritual – o semeador, a rede de pesca, o caçador de pérola, o fermento que é trabalhado pela dona de casa, o grão de mostarda, algo tão costumeiro para os homens daquele tempo, e pergunta aos discípulos:

“Entendestes todas estas coisas? Disseram-lhe eles: Sim, Senhor”.

Não havia como não entender aqueles arranjos tão belos, aquelas ilações tão descomplicadas, aqueles comparações tão objetivas, aquelas conclusões tão sintéticas, mas de mergulhos tão interessantes.

Ao final, eles apenas afirmam, numa concordância muda e tácita: “Sim, Senhor.”

Simplesmente, não há o que falar.

No versículo 44, Jesus se utiliza de uma das mais belas parábolas encontradas nas Escrituras – a parábola do tesouro escondido.

Ele afirma que o Reino dos Céus é semelhante a um tesouro que está oculto no campo, o qual certo homem estando a trabalhar na terra, acaba por encontrar o tesouro, sai “transbordando de alegria, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo”.

E nisso aqui está um dos mais belos ensinamentos existenciais que são ensinados nas Escrituras.

Aqui mostra como se porta aquele que acha no coração as verdades, o tesouro, atinentes ao Reino de Deus.

Ele vai e emprega tudo o que tem para a aquisição daquele tesouro.

Ou seja, despende forças, reuni desejos e passa a viver para aquele tesouro, que passa a ser a razão da sua existência.

Lembro-me aqui do apóstolo Paulo em Filipenses 3.8.

Paulo diz: “E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como escória, para que possa ganhar a Cristo”.

Ele diz que após ter achado o tesouro, todas as demais coisas tornaram-se “escória”, “refugo”, “resto”, “rebotalho” ou qualquer coisa desprezível.

Ou ainda num sentido mais radical: como “estrume”, “esterco” ou “fezes”.

Paulo passou a considerar todas as demais coisas que não imprimiam na alma os valores desse tesouro, como fezes, como dejeto humano, como qualquer evacuação.

Esse é o sentido mais radical da firmação de Jesus.

Aquele que acha o tesouro escondido do reino, vai, vende, deixa todas as relações, todos acordos hediondos promovidos pela cegueira que mente para a vida e passa a se dá para esse tesouro.

A alma dele enche-se de alegria.

Mesmo não tendo nada aos olhos os humanos, aquele que achou esse tesouro, tem tudo.

A sua existência passa a ser de alegria.

Ele passa a viver para esse tesouro maravilhoso.


Por Carlos Antônio M. Albuquerque.

Data: Quarta-feira, 11 de janeiro de 2006, 9:26:37 M